Americana Cria Startup para Cães Viverem Mais e Melhor

Ago 16, 2025 - 23:05
Ago 17, 2025 - 02:46
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Americana Cria Startup para Cães Viverem Mais e Melhor

Forbes, a mais conceituada revista de negócios e economia do mundo.

Os cães não vivem o suficiente. O labrador da sua família pode chegar aos 14 anos; raças maiores, como o bernese, têm sorte se alcançarem 9. Celine Halioua acredita que eles merecem alguns anos a mais. Cientista, ex-doutoranda de Oxford e ex-chefe de gabinete do primeiro fundo de capital de risco voltado a biotecnologias ligadas à longevidade, ela passou quase seis anos construindo a Loyal. A startup sediada em São Francisco desenvolve medicamentos para retardar o envelhecimento canino. O objetivo é agir sobre desequilíbrios metabólicos e hormonais antes que eles se tornem doenças.

O primeiro comprimido da empresa – com sabor de carne – pode chegar ao mercado já em 2026, com potencial para prolongar a vida dos cães e, talvez, um dia, também a nossa. “Percebi que fazer isso em humanos exigiria bilhões de dólares, questões de patentes e muito trauma, mas em cães era viável”, diz a empreendedora de 30 anos, que é tutora da Della, uma rottweiler mestiça idosa que adotou há três anos.

A Loyal ainda não tem faturamento, mas já conversa com a FDA, agência federal do Departamento de Saúde dos EUA, e superou etapas iniciais importantes. No programa de aprovação condicional da agência para medicamentos veterinários inovadores, Halioua espera autorização para lançar seu primeiro produto no mercado – um fármaco que altera o metabolismo de cães idosos (a partir de 10 anos) para imitar os efeitos de uma dieta de baixa caloria, comprovadamente capaz de prolongar a vida.

Outro foco da empresa são injeções e comprimidos para aumentar a longevidade de raças grandes, reduzindo a produção de um hormônio de crescimento mais presente nelas do que nas pequenas.

Desde a fundação, a Loyal captou US$ 135 milhões em equity (e outros US$ 20 milhões em dívida de risco) de investidores como Bain Capital, First Round, Khosla Ventures e Valor Equity Partners, alcançando um valuation de US$ 425 milhões. O mercado é enorme: só nos EUA existem quase 90 milhões de cães, distribuídos em cerca de 60 milhões de lares, segundo a Associação Veterinária Americana. No ano passado, cada casa gastou, em média, US$ 1.852 com seus pets – uma alta de 6% sobre 2023. Caso consiga aprovação regulatória, a Loyal poderá rapidamente faturar centenas de milhões.

Esse potencial fez com que a empresa integrasse a lista Next Billion-Dollar Startups deste ano, seleção anual da Forbes das 25 companhias mais promissoras para atingir US$ 1 bilhão em valor de mercado. Embora a inteligência artificial domine a edição, a Loyal prova que nem toda startup de sucesso precisa estar nesse setor. “Algumas coisas são importantes demais para não serem tentadas. A Loyal é uma delas, e parece que funcionou bem”, diz Vinod Khosla, investidor cuja empresa já apostou em mais de 10 negócios ligados à longevidade e tutor de dois cachorros de uma raça gigante que pode pesar até 68 quilos.

Dos cães aos humanos

Embora o mercado inicial seja o canino, a ambição é que o sucesso leve a um objetivo ainda maior: desenvolver medicamentos para aumentar a longevidade humana. Mas o desafio é imenso: obter aprovação para um fármaco veterinário pode custar US$ 25 milhões e levar cinco anos. Para humanos, o custo ultrapassaria US$ 1 bilhão e o prazo, uma década. Além disso, a área de longevidade humana é repleta de produtos sem comprovação, clínicas de reputação duvidosa e promessas exageradas.

“Quando as pessoas pensam em longevidade, lembram logo de óleo de cobra ou de bilionários tentando viver para sempre, com afirmações descabidas. A abordagem da Loyal é muito mais sutil”, afirma Halioua. Para ela, no fim, a ciência vai prevalecer. “O público vai ficar impressionado quando descobrir que pode ir ao veterinário e conseguir um medicamento para prolongar a vida do seu cão. E, depois, vai se perguntar: ‘Por que não posso fazer isso pela minha avó?’”

A trajetória de Celine Halioua

Halioua, ex-integrante da lista Forbes 30 Under 30 de 2022 dos EUA na categoria de Ciências, cresceu em Austin, Texas. Sua mãe, uma imigrante marroquina com doutorado em nutrição, e seu pai, um imigrante alemão que trabalhava como carpinteiro, se estabeleceram lá quando a cidade era mais conhecida por hippies do que por carros da Tesla. Ela cresceu quase em um zoológico, com mais de 10 gatos, vários cães e outros animais resgatados. “Sempre tínhamos filhotes de gatinhos e esquilos, gambás, tartarugas e pássaros com asas quebradas.”
Na Universidade do Texas em Austin, ela começou como estudante de artes, mas logo descobriu que sua verdadeira paixão era a ciência. As longas horas no laboratório e dois verões trabalhando com doenças neurológicas no Sanford Consortium for Regenerative Medicine, em San Diego, aprofundaram seu interesse por medicina preventiva e longevidade.

“Simplesmente não fazia sentido para mim esperar até que os pacientes fossem diagnosticados com uma doença aguda e terminal para só então tentar intervir e ajudá-los”, diz. “Não esperamos que o motor do nosso carro esteja fumegando na estrada para fazer a manutenção. Por que não fazemos o mesmo com o corpo humano?”

Em janeiro de 2018, enquanto fazia seu doutorado em Oxford sobre a economia da terapia genética, ela se juntou ao Longevity Fund, uma firma de capital de risco em São Francisco (e, oficialmente, largou Oxford em 2019). Lá, conheceu uma pesquisa inicial que mostrava como uma única mudança genética poderia estender a vida de um verme. Ficou fascinada. Mais tarde, leu um estudo de 14 anos do Instituto Purina sobre restrição calórica em labradores, que descobriu que reduzir a quantidade de comida em 25% poderia aumentar a expectativa de vida deles em quase dois anos. Hoje, ela tem uma tatuagem no braço com a cabeça de um labrador, o rosto de um rato e o corpo sinuoso daquele verme, o trio representando alguns dos estudos de extensão de vida mais bem-sucedidos já realizados. “Essa biologia já existia há décadas”, diz. “Eu fiquei extremamente fascinada, um tanto obcecada, mas ninguém nunca tinha transformado em um medicamento.”

Em 2019, ela encontrou uma pessoa com a mesma mentalidade: o investidor Greg Rosen, agora sócio da BoxGroup, que estava pensando em criar uma startup de clonagem de cães com base em uma pesquisa que viu na Coreia do Sul. Halioua tomou um café com ele e o abordou com uma ideia relacionada. “Ela disse: ‘Olha, não sei nada sobre clonagem de cães, mas todo o meu trabalho é sobre longevidade. Que tal um negócio de longevidade canina?'”, conta Rosen. “Passamos os seis meses seguintes debatendo. ‘Isso é remotamente viável tecnologicamente, e será que conseguimos levantar dinheiro?’”

Em janeiro de 2020, a Loyal foi lançada com US$ 4,5 milhões em investimento semente e um objetivo único: desenvolver o primeiro medicamento para prolongar a vida. “Todo mundo dizia: ‘Não é possível'”, conta Halioua. “Eu respondia: ‘É possível’.”

A primeira ideia foi desenvolver uma injeção de terapia genética de dose única para retardar o envelhecimento em cães grandes, inibindo um hormônio de crescimento. Mas a terapia genética é ridiculamente cara, e uma dose única também aumentava os riscos de algo dar errado. “Eu não daria para a minha cachorra se tivesse uma chance em mil de matá-la.”

Ela voltou à prancheta e decidiu focar em injeções e pílulas mais tradicionais, que são mais baratas e seguras, já que os medicamentos não induzem uma mudança genética permanente. Embora a empresa ainda não tenha definido os preços, ela imagina que o custo ficaria entre o de um medicamento para verme do coração e injeções para artrite, ou menos de US$ 150 por mês. “Não pretendo cobrar preços abusivos.”
O timing foi impecável: em 2019, a FDA havia expandido a aprovação condicional para certos medicamentos inovadores para animais, permitindo que fabricantes como a Loyal vendessem seus medicamentos após demonstrarem sua segurança e capacidade de produção, mas antes de comprovarem totalmente sua eficácia. Eles então têm cinco anos após a aprovação para demonstrar que o medicamento funciona com estudos clínicos contínuos.

Em fevereiro deste ano, a Loyal deu um passo significativo para a aprovação condicional de seu primeiro medicamento, que imita a restrição calórica, quando o Centro de Medicina Veterinária da FDA disse que a empresa havia demonstrado ter uma “expectativa razoável” de eficácia. Halioua estava em um casamento no Panamá com seu namorado (agora noivo) quando recebeu a notícia de sua equipe regulatória pelo Slack. Ainda na piscina, ela começou a gritar quando soube da notícia. “Acho que pensaram que eu tinha sido pedida em casamento e trouxeram champanhe.”

Na Barlow Trail Veterinary Clinic, em Sandy, Oregon, a Dra. Jaime Houston inscreveu 105 cães no estudo da Loyal com seu primeiro tratamento, que ajuda a regular o metabolismo de cães idosos para ajudá-los a viver mais. “Eu converso sobre a Loyal com a maioria dos meus clientes que têm cães mais velhos, e nove em cada dez querem que seus cachorros participem do estudo”, diz Houston.

A Loyal deu a dose no primeiro paciente, um whippet de 11 anos chamado Boo, em dezembro de 2023. O estudo duplo-cego, controlado por placebo, que deve durar cerca de cinco anos, já inscreveu 1.300 cães em mais de 70 clínicas veterinárias pelos Estados Unidos. É o maior ensaio clínico com animais já realizado.

Halioua tem um segundo medicamento em andamento focado em cães grandes. A versão em pílula é baseada em uma molécula criada pela Crinetics Pharmaceuticals, uma empresa de capital aberto, que originalmente fazia parte de um medicamento humano para tratar problemas com excesso de hormônio de crescimento. “Eles tinham essa hipótese sobre cães grandes, e nós tínhamos esse composto de classe clínica que não usaríamos para mais nada”, diz o cofundador e diretor científico da Crinetics, Steve Betz. Melhor ainda, da perspectiva da Loyal, ele já havia sido testado – e se mostrou capaz de reduzir o hormônio de crescimento – em ratos e cães.

Eventualmente, o trabalho da Loyal com cães pode abrir caminho para medicamentos de longevidade humana. Mas, enquanto isso, Halioua está convencida de que será um divisor de águas para os milhões de americanos que desejam ter mais tempo com seus cães. “Nunca tive ansiedade por estarmos errados”, diz ela. “É para onde o mundo está indo.”

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